3 de outubro de 2003

Angel - The End

A angel foi o meu primeiro amor cibernético. Se calhar é por isso que gosto tanto dela. Foi a primeira pessoa que me disse “Sorry. I am not into cyber sex”. Fiquei admiradíssimo. Não foi por causa de gostar daqueles conversas eminentemente sexuais; foi porque eu pensava que todos os frequentadores daqueles lugares só queriam uma coisa. A angel foi a primeira que disse que não e, contudo, fiquei a falar com ela. Ainda hoje não sei porquê.
Se estou arrependido? Não sei. Acho que não. Nunca me tinha apetecido escrever um livro antes de a conhecer. Mentira. Apetece-me escrever um livro sempre que estou na merda. Mentira. Apetece-me escrever um livro sempre que estou apaixonado. Também me apetece escrever um livro sempre que leio um livro de que gosto muito, mas como leio pouco, foram mais as vezes em que a paixão me motivou.
A angel não me pôs a escrever livros, no entanto, fartei-me de lhe enviar mensagens electrónicas. O mal foi quando lhe falei do meu “estado civil” e ela voou. Aí entrei em parafuso. Passei algumas horas à procura de um computador no sul de França, onde estava de férias, a mandar-lhe mensagens românticas em que chorava a minha desgraça. Como estava a decorrer o festival de cinema de Cannes, achei que era boa ideia mandar-lhe alguns e-mails em nome de artistas de cinema. Como era de esperar, ela não resistiu a tanto charme. Quem pode ficar indiferente a uma mensagem assinada por Jeremy Irons em que ele diz que me viu na rua e ficou assustado com o meu ar triste e abatido. E continuava, como se eu e a vedeta fossemos amigos de longa data, a explicar que eu estava assim triste porque tinha conhecido uma rapariga fantástica que não me passava bola porque eu lhe tinha mentido. E depois o Jeremy assinava todo o tipo de cunhas: “fala com ele, angel”, “dá-lhe uma hipótese”, “o Paulo sempre foi um tipo fantástico”.
As cunhas do Jeremy Irons funcionaram, já para não falar nas dos irmãos Taviani. Na altura achei que dava uma certa pinta escolher os Taviani. A angel parecia-me suficientemente ilustrada para saber que eles existiam e, por outro lado, dois realizadores europeus ficariam sempre bem a interceder por mim. E fizeram-no em diálogo. Escusado será dizer que o texto roçava a genialidade. E numa língua estrangeira! Se provas fossem precisas, bastava contar que ela me respondeu imediatamente na vez seguinte em que a encontrei na rede. Fiquei contentíssimo por ela falar comigo outra vez e resolvi atirar-me de cabeça. Caí mal. Ela nunca mais me ligou nenhuma.
Voltei a vê-la num chat semanas depois e ainda lhe disse olá. Ela respondeu-me: “estou ocupada”.

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